domingo, 29 de junho de 2008

Virando o travesseiro

Vou te ensinar um jeito de esquecer o sonho ruim e voltar a dormir: todas as vezes que tiver um sonho ruim, vire o travesseiro. Assim, o pesadelo vai embora.

Com essas palavras, minha mãe me ensinou a superar as primeiras dificuldades da infância: a longa noite de sustos, recheada de pesadelos.

Nunca mais abandonei esse jeito de voltar a dormir e descansar.
Com o tempo, esse “virar o travesseiro” começou a ficar muito parecido com “passar as páginas de um livro”. Aprendi a ler e a apreciar as ilustrações dos livros de uma coleção de contos de fadas. Cada volume era recoberto com uma capa de uma cor e a coleção tinha muitos volumes. Eu adorava ir passando as páginas, olhando para as ilustrações e me distraindo com as personagens que passaram a fazer parte do meu dia-a-dia. Não havia dia que os livros não fossem espalhados e folheados incansavelmente. Minha irmã mais nova me acompanhava nessa aventura e inventou uma brincadeira: cada uma pegava um dos livros e ia virando as páginas até chegar a uma ilustração. Quando a ilustração aparecia, observávamos os detalhes, descrevíamos e chegávamos a um acordo: às vezes, a minha era mais bonita; às vezes, a dela. Assim, passávamos horas, pois sendo uma coleção de muitos livros, as combinações eram também inúmeras. O tempo passava e, nesse virar as páginas, outras dificuldades da vida de criança iam sendo superadas.

Aprendi outras coisas também na infância: todas as mulheres da minha família aprendiam a fazer crochê, tricô, ponto de cruz e outros pontos de bordados; aprendiam também a costurar, pregar botão, fazer bainha. Eu gostava especialmente do crochê, do tricô e do bordado.

Com o tempo, esse “tecer com as mãos” também começou a ficar muito parecido com o virar o travesseiro e passar as páginas dos livros. Era preciso escolher a cor da linha e ir tecendo com atenção para não errar nos números dos pontos. Assim passava muito tempo e não pensava em outra coisa.

Jamais abandonei esses aprendizados, mesmo depois de tantos anos. Eles fazem parte da minha vida e são a minha salvação: tenho pesadelos, mas sei como superá-los; sinto alguns medos ao enfrentar problemas comuns da vida adulta, mas viro as páginas e teço outras histórias.

Foi assim que os livros cheios de histórias passaram a ocupar espaço cada vez maior na minha vida. E também foi assim que conheci tantas e tantas histórias; tantos e tantos amigos que, como eu, amam as histórias, as ilustrações, os livros. Então, também foi assim que conheci a Alessandra e a Bia, a menina que pescava estrelas e o jacaré Bile. E outro dia, sonhei que conhecia o jardim dessas meninas...

Um comentário:

Alessandra Roscoe disse...

Anna,
Você é dessas flores raras que encontramos pelo caminho, colhemos e decidimos eternizar, talvez dentro de um livro que amammos! Adorei suas palavras e acho que o blog abre em grande estilo o espaço dos artigos! Grande beijo e saiba que este espaço será sempre seu!