segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Dica de Leitura

Agora então, as dicas de hoje: Escolhi quatro livros que indico agora: Dois deles são livros de cabeceira do Felipe que até decorou as quadrinhas e sai pela casa cantando como viu a turma do Tapetes Contadores de História fazendo. Contos de Bicho do Mato e Contos de Enganar a Morte, os outros dois também são muito divertidos, assim como toda a extensa obra deste maravilhoso autor. Com vocês algumas das viagens propostas por Ricardo Azevedo!

Um rei que tem tudo mas não consegue ser feliz, até o dia em que conhece uma moça pobre cheia de truques. Um rapaz parte para conhecer o mundo. Encontra uma princesa caprichosa que só se casa com quem ela não puder encontrar com sua luneta mágica. Um soldado velho que usa sua inteligência, criatividade e poesia para se livrar da morte. Dois amigos, um pobre e um rico, saem pelo mundo por causa de uma aposta. Qual dos dois conquistará a linda fazendeira? Uma árvore mágica que sabe adivinhar e o drama de uma princesa que sempre teve tudo na vida e de repente precisa lutar contra a desesperança, a inveja e a maldade. Isso sem falar nas divertidas aventuras de João Grilo, um herói malandro cheio de manhas e artimanhas que usa do humor e da esperteza para se dar bem na vida e ainda por cima se casar com a princesa. As histórias do livro Contos de Adivinhação resgatam um pouco da enorme riqueza da nossa cultura popular e têm como ponto em comum o herói que se vê obrigado a decifrar ou lançar uma adivinha para se livrar da aflição ou da morte. Nas palavras do autor, as adivinhas populares podem “ser consideradas uma espécie de introdução à linguagem poética”, pois, “longe de ser apenas brincadeiras com palavras, (...) costumam também ser metáforas. Ou seja, dizem uma coisa, mas ao mesmo tempo querem dizer outra”. Fora tudo isso, as histórias deste livro abordam temas que, além de humanos, são sempre atuais: a busca da felicidade, as dificuldades da conquista amorosa, a busca do auto-conhecimento, as competições humanas, a luta do velho com o novo, a malandragem e os ardis, entre outros assuntos que fizeram, fazem e sempre farão parte da vida de todos nós.

. “Não é por andar com livros/ Que a gente vira doutor/ As traças vivem com eles/ Não sabem ler não senhor.” Uma das 32 quadras de bichos (4x8) que servem de intervalo para as 24 histórias (4x6), essa serve de exemplo de astúcia e bom humor, neste novo livro de um dos escritores mais renomados da nossa literatura infanto-juvenil. A linguagem mimetiza a fala cabocla, sem “pitoresquismo”; e a estrutura da narrativa, via de regra, se alça em peripécias até a virada final, que é quase sempre um golpe de inteligência, protegendo o mais fraco do mais forte.
Há vários duelos (macaco e onça), trincas (galo, galinha, cachorro-do-mato) e até um quinteto (cachorro, burro, porco, galinha e bode). Há histórias muito conhecidas, em versões com variantes (Forró no céu); e outras que, de tão antigas, viraram novidade. Alguém poderia se queixar de uma certa repetição de fórmula – sentenças não muito longas, parágrafos curtos, entremeados por diálogos. Mas o que se tem aqui é uma ótima antologia de contos, para serem lidos aos poucos,, no ritmo que cada um cria para si. E a repetição, afinal, serve para fixar a referência: uma das nossas matrizes, que está para a literatura como as modas de viola e as toadas para a nossa música popular.


Lidar com a morte nunca foi fácil e ainda mais com as crianças. Neste Livro Ricardo Azevedo trata o tema e até faz rir, ele mesmo define a importância do trabalho: "
Certa segunda-feira, eu estava na quarta série do primeiro grau, a professora entrou na classe com uma péssima notícia: o pai de um nosso colega tinha morrido afogado em Bertioga, no litoral paulista. Lembro do sentimento de medo: e se meu pai também morresse? Lembro de estremecer de pena e tristeza por causa do meu amigo. Lembro de me perguntar: o que é a morte? Trata-se de um grave erro considerar a morte um assunto proibido ou inadequado para crianças. Heróis nacionais como Ayrton Senna, presidentes da república e políticos importantes, ídolos populares, parentes, amigos, vizinhos e até animais domésticos infelizmente podem morrer e morrem mesmo. A morte é indisfarçável.Alguns adultos, porém, ainda insistem em acreditar que alienar crianças pode contribuir, de alguma forma, para sua formação (!). Falar sobre a morte com crianças, é preciso deixar claro, não significa entrar em altas especulações ideológicas, abstratas e metafísicas. Nem em detalhes assustadores e macabros. Refiro-me a simplesmente colocar o assunto em pauta. Que ele esteja presente, através de textos e imagens, simbolicamente, na vida da criança. Que não seja jamais ignorado. Isso, note-se, nada tem a ver com depressão, morbidez, falta de esperança ou niilismo. Ao contrário, a morte pode ser vista, e é isso o que ela é, uma referência concreta e fundamental para a construção do sentido da vida. Existem assuntos sobre os quais adultos sabem mais e podem ensinar crianças. Entre eles não se encontram, por exemplo, a paixão, o sublime, a determinação da realidade e da fantasia, o sonho, a temporalidade e a busca do auto-conhecimento. Nem, muito menos, a morte e a mortalidade. Diante de assuntos assim, é preciso reconhecer, adultos e crianças sentem-se igualmente despreparados. É muito bom quando a criança consegue se identificar com um adulto e descobrir, surpresa: “Puxa, ele é igual a mim! Ele também fica confuso, tem medo e não sabe direito!. Ele também se emociona e chora!”. Para a formação das crianças é essencial que surjam espaços de compartilhamento entre elas e os adultos. Crianças da vida rural, em geral muito pobres, costumam ter um contato bem mais sadio e natural com a morte. Dizia Walter Benjamim, sobre a época medieval, que naquele tempo “não havia uma só casa e quase nenhum quarto em que não tivesse morrido alguém”.O mesmo pode-se afirmar da vida rural e de muitos bolsões de pobreza urbana hoje no Brasil.Lamentavelmente, a vida na sociedade tecnológica e de consumo, entre outros fatores, acabou por higienizar e explusar a morte do universo dos vivos. Isso tem tido um grande reflexo na vida das pessoas, nas famílias e nas escolas. Para ficar num exemplo, os jovens que assassinaram o pataxó Galdino de Jesus, alunos de escolas consideradas ótimas, talvez não fizessem o que fizeram se tivessem tido a chance de meditar um pouco mais sobre a mortalidade e a condição humana. Tento dizer que a violência de nosso dias pode ter a ver, entre muitos outros fatores, com o processo de alienação e ocultação da morte. Crianças e jovens precisam aprender a lidar com a vida, da qual a morte é parte inseparável. Pretender camuflá-la ou esconde-la é um desrespeito à inteligência e à capacidade de observação de qualquer ser humano. Além do que é completamente inútil.Daí, a meu ver, a importância desses antiqüíssimos Contos de enganar a morte, narrativas populares que têm como ponto comum o herói que tenta vencer a morte. Com sua poesia, graça e magia, além de levantarem o assunto possibilitando, portanto, uma interessante reflexão, são, com certeza, uma verdadeira, divertida e apaixonada declaração de amor à vida.Para terminar, gostaria de contar que venho mexendo com temas e assuntos da cultura popular desde agosto de 1981 quando publiquei , na Folhinha de S.Paulo, o texto Monstrengos de nossa terra, na verdade um pequeno inventário de seres fantásticos criados pelo povo.Desde então, tenho pesquisado formas literárias populares, principalmente os contos de encantamento, adivinhas, quadras, frases feitas, anedotas e ditados.O resultado desse trabalho está publicado nos livros Histórias folclóricas de medo e de quebranto, O moço, o gigante e a moça, João Forçudo, Pedro João e José, Histórias de bobos, bocós, burraldos e paspalhões, Meu livro de folclore, Armazém do Folclore, No meio da noite escura tem um pé de maravilha!, Bazar do folclore, Histórias que o povo conta e Se eu fosse aquilo."

Histórias que surpreendem, histórias que encantam, histórias que resgatam histórias. Neste livro, Ricardo Azevedo traz para a literatura a arte dos contadores de histórias, dos narradores que perpetuaram lendas. Traduz o melhor de nossa cultura popular de maneira leve, gostosa de ler.

Pra todos que se permitirem embarcar, boa viagem e ótimas leituras!




Nenhum comentário: